ColunistasFrei Marcos Sassatelli, op

A questão da “ideologia” na Igreja [Parte 2]

Podcast Outro Papo de Igreja, do Serviço Teológico Pastoral

Vimos na Parte 1 (leia aqui), que na história – no tempo e no espaço – todo posicionamento prático e/ou teórico do ser humano é ideológico. O que realmente importa é que seja um posicionamento ideológico que liberte e promova a vida.

Como nos lembra Leonardo Boff, “todo ponto de vista é a vista de um ponto”. Ora, o ponto de vista da Igreja e de todo cristão ou cristã deve ser – ou deveria ser – a vista do ponto de Jesus de Nazaré, que é o ponto dos Pobres.

Portanto, para a Igreja e todos os que somos cristãos ou cristãs, ver do ponto de vista de Jesus de Nazaré – seguindo o seu caminho desde a manjedoura até sua morte na cruz e sua Ressurreição – é fazer a Opção pelos Pobres. Lamentavelmente, à expressão “Opção pelos Pobres”, a Igreja acrescentou (com maior frequência nos Documentos mais recentes) a palavra “preferencial” para contentar aqueles (sobretudo padres e bispos) que não entenderam o que essa Opção significa.

Conheço padres e bispos que – quando convidados para participar de Encontros de Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) ou de Pastoral da Juventude do Meio Popular (PJMP), falam de Comunidades Eclesiais (destacando – sobretudo hoje – a palavra “Missionárias”) ou de Pastoral da Juventude, mas nunca pronunciam (parece que há um bloqueio psicológico) as palavras “de Base” ou “do Meio Popular”: palavras perigosas por serem “ideológicas” (leiam: do lado dos Pobres). 

Lembro a essa Igreja (para a qual só é “ideológico” o que está do lado dos Pobres) que uma Comunidade Eclesial é Missionária (Comunidade “em saída”) somente se for “de Base”, ou seja, encarnada na vida do Povo, na vida dos Pobres como fez Jesus de Nazaré, que nasceu na manjedoura de um estábulo e – a partir da manjedoura – anunciou a Boa Notícia do Reino de Deus a todos e todas.

Por outro lado (reparem!), essa mesma Igreja usa – de boca cheia e sem nenhum receio de ser “ideológica” – as palavras “Pastoral do empreendedor” (“empreendedor” não é pobre, portanto, não é ideológico), “Grupo de empresários católicos” (“empresários católicos” não são pobres, portanto, não são ideológicos), “Grupo de advogados católicos” (“advogados católicos” – sobretudo se forem “juízes” ou “desembargadores” – não são pobres, portanto, não são ideológicos), e assim por diante. Para essa Igreja, o “perigo” de conotação ideológica só existe em relação aos Pobres, ou seja, para quem fica do lado dos Pobres. 

Por fim, pergunto: qual foi o posicionamento “ideológico” de Jesus de Nazaré? Ele ficou do lado dos poderosos ou do lado dos pobres? A resposta encontra-se no motivo que foi apresentado para justificar a sua “criminalização” pelos “desembargadores” da época, com as “bênçãos” do Sinédrio. “Achamos este homem (Jesus) fazendo subversão entre o nosso povo” (Lc 23,2).

Hoje – lamento isso – no prédio do Tribunal de Justiça de Goiás tem até Capela Católica com Sacrário e capelão: uma prática clara e indiscutivelmente inconstitucional. A razão da Capela deve ser para que os “desembargadores católicos” possam rezar diante do Santíssimo Sacramento e (quem sabe!) “assistir” à Missa do capelão recebendo a comunhão, antes de “criminalizar” trabalhadores e trabalhadoras “sem terra” e “sem teto” ou seja, o próprio Jesus na pessoa dos pobres que lutam pelos direitos sagrados à terra de trabalho e à terra de moradia assinando “ordens de despejo” (legais, mas injustas, desumanas, antiéticas e anticristãs) de suas Ocupações. Que descaramento! Quanta hipocrisia! 

Os cristãos e cristãs perguntemo-nos: que Igreja queremos ser? A dos fariseus hipócritas ou a de Jesus de Nazaré? Que o Espírito Santo nos ilumine e nos transforme em verdadeiros profetas e profetisas da Boa Notícia do Reino de Deus no mundo de hoje. Assim seja!

Todo ponto de vista é a vista de um ponto.... Frase de Leonardo Boff.
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Águas e Profecias: Luzes do Meio Popular gerando Vidas
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